segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Sobre o amor, ossos secos e outras coisas...


E, de repente, você, com os olhos fechados, se agarra a um osso seco e roído, acreditando piamente que aquilo se trata de um filé mignon ao molho rôti e se lambuza.
As pessoas que realmente se importam com você te falam, te avisam, te alertam, mas não adianta. Você continua jurando que aquilo que você está segurando é uma iguaria daquelas dignas de um prêmio de gastronomia.
(Inconscientemente você percebe que aquilo não tem gosto, mas continua se lambuzando...)

Até que um dia você resolve abrir os olhos.
Não é assim tão simples. Você não abre os olhos e vê de cara. Você precisa passar por uma humilhação enorme pra se dar conta do que realmente está acontecendo.
Primeiro você percebe que estão todos te olhando. As pessoas que te amam estão ali pra te segurar, te apoiar. Aqueles que não gostam tanto assim de você estão esperando o momento pra jogar na sua cara que estavam certos o tempo todo. Você ainda tenta disfarçar, fecha os olhos de novo e finge que está tudo certo... o seu filé mignon ao molho rôti ainda está ali nas suas mãos. Mas o gosto já não é mais o mesmo...

Num surto de desespero você abre novamente os olhos, olhando pra si mesmo e para aquele osso que, além de seco e roído, já está podre.
 

E então as coisas começam a fazer sentido...
A falta de tempo, a falta de interesse, os argumentos sem fundamento, as desculpas esfarrapadas, as lágrimas que sempre estiveram presentes, as promessas não cumpridas, os planos não compartilhados, os sonhos que eram pequenos demais ...

Agora tudo faz sentido.
E aí chega o momento em que você se desapega daquele osso que já está em decomposição, espalhando aquele cheiro insuportável nas suas mãos, no seu corpo, nas suas roupas, na sua vida.
E esse é o momento de você lavar as mãos, trocar as roupas, tomar um banho bem demorado, pra tirar de você todas as lembranças. E esperar pelo banquete que você realmente merece degustar.

terça-feira, 4 de setembro de 2012

Jornada

"Estou no meio do caminho e as pernas pedem descanso.
Os pés doem, sujos de terra, exaustos.
Caminhei tanto depois que nos conhecemos. Mal vejo a menina torta que eu era naquele dia quente de fevereiro.
Era mais gostoso quando você andava comigo. Mesmo à frente, você me estimulava a dar passadas mais largas, aumentando o ritmo para que chegássemos mais cedo.
De repente pisquei os olhos e cadê você?
Estou no meio do caminho e daqui nem dá pra ver o meu destino. Parecia mais simples quando éramos dois rumo ao desconhecido.
Andei tanto e já não há nenhum estímulo. Continuo porque estou no meio do caminho e não dá para parar aqui, nessa maldita estrada de terra onde não passa ninguém.
Será que você se escondeu para me observar ou cansou da minha lentidão e foi na frente? Eu nunca te deixaria para trás, amor. Vem me buscar?
A cada cem passos eu paro e olho ao redor. Não tem cabimento voltar, mas dói tanto seguir em frente. Dói tanto. Doem as pernas, os pés, o âmago, o peito. Doeria meu coração se eu ficasse à vontade para escrever como os velhos poetas.
A cada quilômetro vencido eu penso em você. Ao menos não o vi indo embora. É provável que tentasse alcançá-lo e sabemos que eu jamais conseguiria.
Lembra quando começamos essa jornada? Eu era apenas uma menina mal acostumada e você corria para que eu o alcançasse. Só alcançava porque você deixava.
Sem você a estrada parece mais esburacada, mais tortuosa, mais difícil. Será que a gente se encontra lá na frente?"
 

Agora... o que eu faço?

Já li tudo, cara, já tentei macrobiótica, psicanálise, drogas, acupuntura, suicídio, ioga, dança, natação, cooper, astrologia, patins, marxismo, candomblé, boate gay, ecologia... sobrou só esse nó no peito, agora o que faço?

Caio Fernando Abreu